Quando falou da "lei do Senhor", Davi não queria dizer meramente a lei como foi dada nos dez mandamentos, embora essa também seja perfeita, e seja usada, até certo ponto, na conversão das almas. O termo inclui toda a doutrina de Deus — toda a revelação divina; e embora, nos dias de Davi, não houvesse revelação tão plena e clara como temos — pois o Novo Testamento não havia então sido dado, nem muito do Velho Testamento — contudo o texto não perdeu nada de sua força anterior, mas antes ganhou mais; assim o usarei como aplicável às Escrituras inteiras — à lei e ao evangelho, e a tudo que Deus revelou; e falando disso nesse sentido, posso verdadeiramente dizer que é perfeita, e que converte a alma.
Uma árvore é conhecida por seus frutos, e um livro deve ser testado por seus efeitos. Há livros que produzem seus frutos para o carrasco e a prisão; e tais livros estão muito amplamente espalhados hoje em dia. São frequentemente embelezados com gravuras, e postos nas mãos de meninos e meninas, e uma safra de criminosos é constantemente o resultado de sua publicação e circulação.
Têm sido escritos livros que têm espalhado contágio moral através de séculos. Não preciso mencioná-los; mas se fosse possível ajuntá-los todos numa pilha, e queimá-los como os efésios queimaram seus livros de magia, seria uma das maiores bênçãos concebíveis. Contudo, se isso fosse feito, temo que outros cérebros ímpios se poriam a trabalhar para inventar blasfêmias similares, e que outras mãos seriam achadas para espalhar suas vis produções.
A Palavra de Deus deve ser testada, como outros livros, pelo efeito que produz; e vou falar sobre um de seus efeitos ao qual muitos de nós aqui presentes podemos dar testemunho pessoal. O velho provérbio diz: "Fale como achar"; e vou falar da Bíblia como a tenho achado — para louvar a ponte que me tem carregado sobre toda dificuldade até agora, e que tem carregado muitos de vocês também. Sabemos que a lei do Senhor é boa porque converte a alma; e, para nossa mente, a melhor prova de sua pureza e poder é que converteu nossa alma.
O rosto do homem está voltado para longe de seu Criador. Desde o dia fatal quando nossos primeiros pais quebraram a lei de Deus, temos sido, todos nós, culpados do mesmo grande crime. Estamos como homens que têm as costas para a luz, e estamos indo pela estrada descendente, a estrada que leva à destruição. O que precisamos é ser virados, pois esse é o significado da palavra "convertido" — virado completamente. Precisamos ouvir o comando: "Meia volta, volver," e marchar na direção oposta de qualquer direção em que jamais marchamos antes.
Nosso texto verdadeiramente diz que a Palavra de Deus nos vira. Não quer dizer que a Palavra sozinha faz isso à parte do Espírito de Deus, porque um homem pode ler a Bíblia cinquenta vezes, e, por cinquenta anos, ouvir sermões que todos saíram da Bíblia, e contudo eles nunca o virarão a menos que o Espírito de Deus faça uso da Palavra de Deus ou dos sermões do pregador. Mas quando o Espírito de Deus vai com a Palavra, então a Palavra se torna o instrumento da conversão das almas dos homens.
É assim que a obra da conversão é operada. Primeiro, é pelas Escrituras da verdade que os homens são feitos ver que estão em erro. Há milhões e milhões de homens, no mundo, que estão indo pelo caminho errado, contudo não sabem disso; e há dezenas de milhares que creem que estão mesmo fazendo serviço a Deus, quando estão completamente opondo-se a ele.
Alguns que, tanto quanto está em seu poder, estão mesmo matando a Cristo, não sabem o que estão fazendo. Uma das súplicas que nosso Salvador usou na cruz foi: "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem." Para tomar meu próprio caso, sei que, por anos, não estava consciente de ter cometido pecado algum grande. Havia sido, pela graça restritiva de Deus, guardado de imoralidades externas, e de transgressões grossas, e portanto pensava que estava tudo bem.
Não orava? Não frequentava um lugar de culto? Não fazia o que era certo para com meus semelhantes? Não tinha, mesmo sendo criança, consciência tenra? Parecia-me, por um tempo, que tudo estava bem; e, talvez, estou dirigindo-me a alguém mais que diz: "Bem, se eu não estou certo, admiro-me quem está; e se eu tenho ido errado, onde devem estar indo meus vizinhos?" Ah, muitas vezes é assim que falamos!
Enquanto somos cegos, não podemos ver falhas em nós mesmos; mas quando o Espírito de Deus vem a nós, e nos revela a lei de Deus, então percebemos que temos quebrado todos os dez mandamentos no espírito, se não na letra deles. Mesmo o mais casto dos homens pode bem tremer quando se lembra daquela palavra esquadrinhadora de Cristo: "Qualquer que atentar numa mulher para a cobiçar, já em seu coração cometeu adultério com ela."
A próxima coisa que a Palavra de Deus faz é mostrar ao homem como poderia acertar. E, oh, quão perfeitamente lhe mostra isso! Vem ao homem, e lhe diz: "Seu pecado merece punição. Deus pôs aquela punição sobre seu Filho unigênito; e, portanto, está pronto a perdoá-lo livremente pelo amor de Cristo, não por causa de algo bom em você, ou algo que jamais possa fazer, mas inteiramente de sua livre misericórdia."
"Ele lhe ordena que confie em si mesmo nas mãos de Jesus para que ele possa salvá-lo." Venham, então, e confiem no que Cristo fez, e ainda está fazendo por vocês, e creiam na misericórdia de Deus, em Cristo Jesus, para todos que confiam nele. Oh, quão claramente a Palavra de Deus põe Cristo diante de nós! É uma espécie de espelho no qual ele é revelado.
Cristo mesmo está lá no céu, e um pobre pecador, aqui embaixo na terra, não pode vê-lo por mais tempo que olhe; mas esta Palavra do Senhor é como enorme espelho de olhar, melhor até que o mar de fundição de Salomão; e Jesus Cristo olha para baixo neste espelho, e então, se você e eu viermos e olharmos nele, podemos ver o reflexo de seu rosto. Bendito seja seu santo nome, é verdade, como canta o Dr. Watts:
Mal há um capítulo no qual Cristo não esteja, mais ou menos claramente, apresentado como o Salvador de pecadores. Assim a Palavra de Deus, vocês veem, mostra ao homem que está errado, o tira de caminhos errados de tentar se acertar, e então o põe no caminho para se acertar, isto é, crendo em Jesus.
Mas a Palavra do Senhor faz mais que isso. No poder do Espírito Santo, ajuda o homem a crer; pois, no início, fica bastante atordoado com a ideia de salvação gratuita — perdão instantâneo — o cancelamento do pecado — tudo por nada — perdão para os piores e mais vis livremente dado, e dado agora. O homem diz: "Certamente, é bom demais para ser verdade."
Fica cheio de assombro, pois os pensamentos de Deus estão tão altos acima dele, e tão fora de seu alcance, como os céus estão acima da terra. Então a Palavra vem a ele, e diz: "Vinde agora, e argui-me, diz o Senhor: ainda que os vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve; ainda que sejam vermelhos como o carmesim, se tornarão como a lã."
A Palavra também lhe diz: "Toda maneira de pecado e blasfêmia será perdoada aos homens." A Palavra diz: "A misericórdia do Senhor dura para sempre." "Ele se deleita na misericórdia." "Desfiz as tuas transgressões como a nuvem, e os teus pecados como a névoa." Não preciso continuar repetindo os textos com os quais espero que muitos de vocês há muito estejam familiarizados.
Há grande número deles — preciosas promessas, graciosos convites, e doutrinas consoladoras; e, conforme o pecador os lê, com olhar trêmulo, o Espírito de Deus os aplica à sua alma, e ele diz: "Posso e creio em Jesus. Senhor, aceito alegremente tua misericórdia perdoadora. Olho para aquele que foi pregado na cruz, e encontro nele a cura para as mordidas de serpente do pecado. Creio e crer em Jesus, e arrisco minha alma sobre ele."
É assim que a Palavra de Deus converte a alma, ajudando o homem a crer em Jesus.
Quando a Palavra de Deus converte um homem, tira dele seu desespero, mas não lhe tira seu arrependimento. Ele não pensa agora que seu pecado o lançará no inferno, mas não pensa portanto que seu pecado seja uma ninharia. Odeia o pecado tanto como se temesse que o destruiria para sempre. Esse é tipo grandioso de conversão — que o homem, que havia estado em desespero por causa de seu pecado, seja feito saber que seu pecado está perdoado, e contudo não seja levado a brincar ou mexer com o pecado.
Pela fé, vê as feridas de Jesus, e sabe como Cristo sangrou para libertá-lo da servidão do pecado, e isso o faz odiar o pecado para sempre. Não é essa conversão excelente?
A conversão verdadeira também dá perdão ao homem, mas não o faz presunçoso. Sua transgressão passada está toda perdoada, mas não diz portanto: "Irei, e transgredirei da mesma maneira outra vez. Se perdão é tão facilmente obtido, por que não pecar?" Se homem verdadeiramente convertido jamais falasse assim; ou, se tal pensamento jamais lhe ocorresse, deve ter dito de uma vez: "Para trás de mim, Satanás, pois não compreendes as coisas que são de Deus."
Fala como essa seria diabólica. Pecaremos, para que a graça abunde? Deus nos livre! Embora o homem esteja perdoado, odeia o pecado como a criança queimada teme o fogo. Tem medo que, por qualquer passo inadvertido, possa entristecer seu Senhor, que cancelou o passado.
Ademais, a conversão verdadeira dá descanso perfeito ao homem, mas não para seu progresso. Sabe que a obra que o salvou é a obra terminada do Senhor Jesus Cristo, e que não tem que acrescentar nem um fio sequer ao manto de justiça que lhe foi dado; contudo deseja crescer em graça, tornar-se mais e mais santo, mais parecido com seu Senhor e Mestre.
Enquanto descansa perfeitamente em Cristo, estende as asas de sua alma para que possa voar mais e mais alto em direção a seu Senhor e Mestre.
Novamente, a conversão verdadeira dá segurança ao homem, mas não lhe permite deixar de ser vigilante. Sabe que está seguro, e que nunca perecerá, nem alguém o arrebatará das mãos de Cristo; mas está sempre em guarda contra todo inimigo — contra o mundo, a carne, e o diabo. Um de nossos hinistas põe esta verdade dupla muito docemente:
Não preciso dizer muito, em terceiro lugar, concernente à consequente excelência da Palavra de Deus. A lei do Senhor, que realiza obra tão excelente, deve ser ela mesma excelente. Farei, portanto, apenas uma ou duas observações breves, e então fechar.
"A lei do Senhor é perfeita, convertendo a alma," logo desde o início da conversão até o fim. Sempre que queremos ter conversos — e espero que isso seja sempre — a melhor coisa para nós fazer é "pregar a Palavra." Não há nada melhor; não pode haver nada mais; não deve haver nada menos.
Não me admiro que, em algumas igrejas e capelas, não haja conversões, porque os sermões que são pregados ali não são adaptados a esse fim. São como livro que resenha outro dia, do qual disse que havia, possivelmente, uma pessoa no mundo que o entendia, e essa era o escritor do livro; e que, se ele não o lesse toda manhã, certamente não saberia, no dia seguinte, o que queria dizer com ele.
De maneira algo semelhante a essa, há sermões que são tão envolvidos, perplexos, metafísicos, e não sei o que mais, que não vejo como almas jamais possam ser convertidas por eles. O povo precisa ter dicionário no banco, em vez de Bíblia; nunca precisam voltar-se para referências bíblicas, mas precisam de alguém para explicar-lhes o significado das palavras difíceis que o pregador gosta tanto de usar.
Não tenho também lido sermões, que eram muito bem polidos, e que, ouso dizer, foram precedidos por oração para que Deus convertesse almas por eles? Mas era moralmente impossível que o Senhor fizesse qualquer coisa desse tipo, a menos que revertesse todos seus métodos usuais de procedimento, pois não havia nada no sermão que pudesse ter sido feito meio da conversão de uma alma.
Mas, meu querido irmão, se você pregar a Palavra de Deus, se levantar o Cristo crucificado na haste do evangelho, não precisa ser muito particular sobre o estilo de sua fala. Não precisa dizer: "Devo ser orador de primeira classe; devo ser retórico genial." Creio que muito daquele falar de primeira classe é simplesmente o meio de velar a cruz de Cristo, e que bela conversa sobre Jesus Cristo é quase a última coisa que pobres pecadores precisam.
Então, caros mestres, e caros irmãos ministros, deem-lhes a Palavra. Sim, essa é bainha muito bonita; mas, se você vai lutar, deve tirá-la; e não há nada como a lâmina nua, a espada do Espírito, a Palavra de Deus, para cortar, e talhar, e retalhar, e matar, em sentido espiritual; essa mesma Palavra, pela graça todo-poderosa de Deus, fará os homens vivos outra vez, assim devemos "pregar a Palavra" se queremos ter conversões.
Há outra coisa que sinto que devo dizer-lhes. Não devemos pensar que, para ter conversões, é necessário deixar de fora qualquer parte do evangelho. Tenho medo que algumas pessoas pensem que, se vocês ficarem e gritarem: "Creiam, creiam, creiam, creiam, creiam, creiam, creiam," converterão qualquer número de pessoas; mas não é assim. Devem dizer a seus ouvintes em que devem crer; devem dar-lhes a Palavra de Deus, as doutrinas do evangelho; pois as pessoas, que se diz estarem convertidas sem serem ensinadas das Escrituras, muito cedo precisarão ser "convertidas" novamente.
Deve haver bala e granada em nossas armas se alguma execução real deve ser feita; soprar muito pó, e fazer grande barulho, pode soar muito bem por um tempo, mas não resulta em nada no fim. Exatamente o mesmo evangelho — adaptado quanto a seu tom e método, mas o mesmo evangelho — que prego neste lugar, pregaria numa cozinha de ladrões, ou aos mais pobres dos pobres, e aos mais iletrados da humanidade. É o evangelho, e só o evangelho, que converterá a alma.
Agora, caros amigos, vocês que não estão convertidos, minha palavra final é para vocês. Se realmente desejam força, vida, salvação, vocês a obterão através de ouvir a Palavra de Deus, ou através de ler este Livro precioso. "A fé vem pelo ouvir, e o ouvir pela palavra de Deus." Porta dos Olhos não é usualmente o caminho pelo qual Emanuel entra na cidade de Mansoul.
A elevação da hóstia, as bonitas decorações na roupa do padre, o crucifixo, as estações da cruz, e toda aquela momice romanista, não salvarão ninguém. Esse não é o caminho de Deus da salvação; mas Cristo entra em Mansoul através da Porta do Ouvido. "Inclinai os vossos ouvidos, e vinde a mim; ouvi, e a vossa alma viverá."
Sempre que o evangelho é pregado, caro ouvinte, realmente o ouçam. Lembrem-se de como nosso Senhor Jesus Cristo disse: "Quem tem ouvidos para ouvir, ouça." Algumas pessoas não ouvem. Tenho sido muitas vezes grato, quando ouvi algumas pessoas falar, por ter dois ouvidos, porque, embora sua conversa entre por um ouvido, agradeço a Deus posso deixá-la sair pelo outro, e assim não me faz mal.
Mas se vocês estão ouvindo o evangelho, cuidem para não agir assim. Então deixem seus dois ouvidos serem duas entradas para a Palavra. Não tenham um para entrada, e o outro para saída; mas "habite em vós abundantemente a palavra de Cristo, em toda a sabedoria." Deixem-na entrar por ambos os ouvidos, e permanecer em sua memória até alcançar seu coração.
Não creio que alguém seja ouvinte sincero e atento, desejando ouvir para proveito de sua alma, sem assim ouvir se o evangelho lhe é pregado. Como já lhes disse, a promessa é: "Ouvi, e a vossa alma viverá"; e se vierem com mente disposta — dispostos a julgar, e pesar, e então crer na Palavra — no momento em que realmente crerem, estarão salvos.
Aquela Palavra de Deus, que os leva a crer, já os converteu; assim, saiam, e confessem o que Deus fez por vocês, e então prossigam seu caminho regozijando. Que Deus abençoe cada um de vocês sem uma só exceção, pelo amor de seu nome! Amém.